segunda-feira, 6 de abril de 2009

MUNICÍPIOS DO VALE DO JARI MERGULHADOS NA CRISE

Augusto Praxedes: as demissões foram consequência da crise internacional.
Demissão de trabalhadores, aumento da inadimplência no comércio local, redução nas vendas, aumento dos índices de violência e da criminalidade nas cidades de Almeirim, Monte Dourado, no Pará, Laranjal do Jarí e Vitória do Jarí, no Amapá.
Essa é a nova realidade em que vive a população dos municípios localizados no vale do rio Jarí, que divide os dois estados, depois que a crise econômica mundial estendeu seus tentáculos sobre o distrito de Monte Dourado, em Almeirim, onde estão as empresas do grupo Orsa, herdeiro do que foi um dia o famoso Projeto Jarí, criado pelo americano Daniel Ludwig, no início dos anos 70. A Jarí Celulose é a principal empresa do grupo no município.
Desde o início da crise, no final do ano passado, a Jarí e empresas prestadoras de serviço já demitiram 1.200 trabalhadores. Outra empresa, a Caulim da Amazônia S/A (Cadam), do grupo Vale, demitiu outros cem e deu férias coletivas para mais 200 trabalhadores.
Segundo Augusto Praxedes Neto, gerente de sustentabilidade e relações institucionais do Grupo Orsa, as demissões foram conseqüência inevitáveis da redução nas exportações e na queda do preço da celulose no mercado internacional. “O preço caiu pela metade, a demanda internacional diminuiu. Não tivemos outra saída”, afirmou. Na sexta-feira passada, o preço da celulose no mercado internacional era de 579 dólares a tonelada.
Segundo Praxedes, a produção atual da Jarí Celulose está sendo reduzida em 40 mil toneladas, 11% do que estava previsto para este ano. No ano passado, a produção da empresa alcançou 390 mil toneladas. Até antes da crise, a empresa tinha 4.500 funcionários.

Redução no plantio – Com a queda na produção, a Jarí também reduziu fortemente sua atividade florestal, principalmente no replantio de áreas já trabalhadas, onde ocorreu o maior número de demissões. “Fomos obrigados a reduzir o plantio em 5 mil hectares, inevitavelmente com cortes de vagas de trabalho”, afirmou Praxedes.
É nesse setor da produção que a Jarí Celulose usa a mão-de-obra de empresas prestadoras de serviço, como a Marquesa, a NDR, a RR e a Vix Transportes. Segundo o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Papel e Celulose do Pará e Amapá (Sintracel), com sede em Monte Dourado, a demissão neste setor foi de mais de mil trabalhadores, que faziam os serviços de pesquisa, preparação do solo, plantio e transporte.
Pericó, presidente do Sintracel: "A Jari usa a crise para demitir trabalhadores".

Na versão da diretoria do Sintracel, a empresa não vive crise nenhuma. “Na verdade, eles estão usando a crise para demitir trabalhadores e recontratá-los, através das empresas terceirizadas, sem direitos sociais, como plano de saúde e cestas básicas”, denunciou Francisco Pereira da Silva, o “Pericó”, presidente do Sintracel. Segundo o sindicalista, o custo médio de produção da tonelada de celulose é inferior à metade do valor no mercado internacional. “A empresa tem lucro folgado, está apenas ganhando um pouco menos com a crise internacional”, disse.
Ele afirmou que o número de demitidos é de 1.400, alguns deles em licença de saúde, férias e até mesmo com estabilidade. “O discurso do dono da Orsa é falso, pois ele deixou centenas de famílias entregues à própria sorte, sem opções de sobrevivência, o que obriga os filhos a se tornarem marginais e as moças a se prostituírem para sobreviver”, afirmou.

Queda – “As consequências danosas dessa crise não poderiam ser diferentes, e o comércio é o setor que de imediato sofre os seus efeitos”, a firmou Lúcia Bezerra, empresária local. Confirmando a avaliação da empresária, a Associação Comercial de Monte Dourado e Almeirim estima em 50% a queda nas vendas do comércio local, com redução de pelo menos 10% dos empregos.
O setor de transportes, muito utilizado pela Jarí Celulose e empresas terceirizadas, também teve redução semelhante.
“Nós precisamos de apoio do governo do Estado, e com urgência, com investimentos em obras públicas, como forma de minimizar esses efeitos negativos e dramáticos da crise”, afirmou Carlos Padilha, vice-presidente da entidade que reúne os empresários locais.
Na feira dos produtores rurais, em Monte Dourado, as queixas não são diferentes: todos reclamam da queda nas vendas dos produtos. Segundo João Francisco da Silva, agricultor de 58 anos, a venda de produtos caiu pelo menos 60% na feira. Quase 90 agricultores familiares usam a feirinha para a venda de seus produtos agrícolas e hortifrutigranjeiros.
Na sexta-feira passada, a maioria das bancas estava com produtos sobrando. “No ano passado, num dia como hoje, a gente já tinha vendido tudo. A gente produzia na certeza de vender”, disse Regina dos Santos, 33 anos, que vende carvão vegetal na feira. Hoje, nos dias de venda, o que sobra é levado para a feira da cidade de Laranjal do Jarí, no outro lado do rio, em frente a Monte Dourado.
Antônio Conceição da Silva, 53 anos, estava com caixas de banana que não conseguiu vender. Ele acha que o prédio da feira, velho e deteriorado, construído há onze anos, também prejudica a venda. “Já pedimos várias vezes à prefeitura que construa um novo prédio, eles já fizeram vários orçamentos, mas não fizeram mais nada até agora”, queixou-se. Independente da crise, ele acha que uma nova feira atrairia mais clientes.

Vereador Toca, presidente da Câmara Municipal, pede ação do governo do Estado para minimizar os problemas.

Comissão – Na noite da sexta-feira passada, uma sessão especial da Câmara de Vereadores reuniu, na sede do clube Arejar, em Monte Dourado, cerca de 400 pessoas. Os vereadores e outras autoridades convidadas discutiram a crise que se abate sobre os municípios do vale do Jarí. Eles manifestaram preocupação especial com o Hospital da Fundação Jarí, que se encontra com o prédio deteriorado e com vários setores fechados. O hospital, que antes recebia subsídio do Grupo Orsa, agora sobrevive apenas com os recursos próprios do município e os repasses da União e do Estado.
Mas as consequências decorrentes das demissões nas empresas do distrito também foi abordado por vários deles. “Estamos preocupados com as demissões nas empresas e com suas consequências sociais, como o aumento da violência e da criminalidade”, afirmou o presidente da Câmara Municipal, vereador Antônio Jambo Toca (PMDB). Ele realizou a sessão no distrito justamente para discutir os problemas que se avolumam após as demissões nas empresas locais.

Deputada Josefina Carmo quer que os governos do Amapá e Pará ajam em conjunto.

Presente à reunião, a deputada Josefina Carmo (PMDB) sugeriu a formação de uma comissão de representantes de Almeirim, entre dirigentes públicos e representantes da sociedade civil local, para ir a Belém em busca de socorro.
“É muito grave a situação em Almeirim e Monte Dourado, mas também em Laranjal do Jarí e Vitória do Jarí, no estado do Amapá, que têm relação direta com as atividades econômicas do distrito industrial. É preciso que os poderes públicos do Pará e do Amapá ouçam os clamores daquela população e tomem atitudes imediatas”, afirmou a deputada. Ela vai propor que os governos dos dois estados discutam o problema e ajam em conjunto.
Josefina se colocou à disposição dos presentes para ajudar, junto ao governo do Estado, na busca de apoio às ações necessárias para minimizar os efeitos da crise.

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